Relva em 3D

"A preguiça é a mãe do progresso. Se o homem não tivesse preguiça de caminhar, não teria inventado a roda"

- Mário Quintana 



Movendo-se pela floresta escura, ele passou 
a enxergar cores em meio ao breu. 
Não eram cores óbvias, verdes, como deveriam ser. 
Num instante fantástico, viu ao longe a mata em um púrpura esmaecido, diluído pela chuva incessante. À sua frente, a relva explodia em rosa florescente, contrastando com a profundidade da paisagem.
O encanto durou pouco, mas ficou na memória.
Tudo aconteceu numa fria noite de outono, e ele convicto de que era dono absoluto de seu destino. 
O que aparentemente estava sob controle, se esvaía por entre seus dedos como se fosse relva holográfica, projetada por pensamentos aleatórios. Ele percebeu a tempo que era livre para perseguir seus sonhos, mas alcançá-los era uma outra história. Cansado de esperar uma resposta, questionou mais e mais, admirou a beleza de tudo, reclamou do tempo, sentiu vontade de chorar...e chorou. A chuva misturou-se com suas lágrimas, o que o fez mudar de idéia e erguer a cabeça. Já não podia mais ver nem a relva e nem o breu, a paisagem calou-se.
O mundo ficou quieto e já não era mais mundo, não era nada porque nunca foi coisa alguma. Deixou de existir antes mesmo de ser para começar a permanecer. Num labirinto tortuoso formado por culpa e desespero, o único caminho era o da redenção, que o esperava de braços abertos. Tateando pelo trajeto da incerteza, alternando passos largos com outros mais firmes e cuidadosos, sentiu cansaço e esvaziou sua mente quase que por completo. Restava-lhe o impulso de não desaparecer e utilizar seu mais belo grito guardado há anos, amadurecido pela solidão.
Ficou na lembrança apenas um fragmento daquela imagem, a única capturada pela sua coragem.
Parecia uma relva em 3D, mas era só o que ele entendia como breu.






Comentários

Postar um comentário

Postagens mais visitadas