Aftersun

Não há tal coisa tão simples. Simples é difícil.

- Martin Scorsese

Imaginei por instantes chegar ao mais alto nível das minhas criações, fazer o mínimo numa tela em branco e mesmo assim contar uma história. Ou várias numa só.

Estudar arte por vários anos, fazer mestrado, doutorado, visitar o máximo possível de museus ao redor do mundo e atingir o ápice da complexidade numa obra cuja simplicidade é gritante.
O desenho foi feito a mão livre com lápis preto, a possibilidade de "erro" era real e caso ocorresse, assim permaneceria. O Sol, desenhado com pincel macio, recebeu dois tons de acrílico fluorescente (amarelo e laranja), misturados enquanto eram aplicados e formavam os traços do olho, também feitos a mão livre e sem o temor do erro.
Outra preocupação era interação entre eles, o que acabou ocorrendo - ambos se entreolham, fixamente, criando uma espécie de tensão, contrastando com a total falta de cenário. E por falar em cenário, a opção pela estética "mar de leite" ajuda a construir a sensação de total vulnerabilidade do personagem. Os traços retos indicando um caminho incerto (seria a esquina de uma estrada ou o topo de uma superfície alta?) mostram que o personagem seguia para algum lugar antes de se deparar com o Sol, cujo olhar, sim, o intimidou. Desse embate entre Astro Rei e Ser Humano, já sabemos o desfecho, que mais do que previsível e inevitável, é estarrecedor, frisando a impotência de um perante o poder do outro.